Vírus responsável por surto de febre amarela no Brasil sofre mutação genética inédita

Pesquisadores da Fiocruz afirmam que mutação não diminui eficácia da vacina

A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) finalizou os primeiros sequenciamentos completos do genoma de amostras do vírus da febre amarela referentes ao atual surto da doença no Brasil. A partir da análise da sequência completa do genoma do vírus foi possível constatar a presença de variações em sequências genéticas que estão associadas a proteínas envolvidas na replicação viral. Segundo a instituição, não há registro anterior dessas mutações na literatura científica mundial. Porém, a mutação não interfere na eficácia da vacina atualmente disponibilizada pelo Ministério da Saúde.

Foram investigadas duas amostras de macacos oriundos do Espírito Santo, mortos em final de fevereiro de 2017. Os pesquisadores reforçam que os impactos para a saúde pública ainda precisam ser investigados e apontam para a necessidade de se avaliar mais amostras, relativas a locais diferentes e incluindo casos em humanos, macacos e mosquitos. Os resultados das análises foram divulgados na revista científica ‘Memórias do Instituto Oswaldo Cruz’. Dados ainda não publicados apontam os mesmos resultados para a análise de mosquitos coletados no Espírito Santo e para um macaco que veio a óbito no Rio de Janeiro.

O surto é o mais severo das últimas décadas, e a doença tem se espalhado de forma rápida, com casos em animais e humanos diagnosticados, inclusive em locais considerados livres da doença há quase 70 anos. Os pesquisadores constataram modificações no código genético dos vírus, que foram identificadas na comparação com a sequência genética completa do vírus relacionado a surtos ocorridos desde a década de 1980 no Brasil e na Venezuela.

Uma evidência da mutação foi obtida na análise das proteínas virais, em um passo seguinte à constatação de mudanças na sequência genética. Foi identificado que as mudanças no genoma estavam relacionadas a oito substituições de aminoácidos (as moléculas que compõem as proteínas), descreve a virologista molecular Myrna Bonaldo.

— De forma muito simplificada, o genoma é um código que tem o papel de orientar a produção de proteínas. Essas proteínas são a base da própria estrutura do vírus, formando seus elementos constitutivos, como as paredes do vírus, por exemplo.

Myrna ressalta que as implicações biológicas e epidemiológicas dependem de outros estudos e que mais dados são necessários para esclarecer o eventual papel das alterações genéticas detectadas no contexto do atual surto da doença.

— Temos uma evidência que constitui um elemento novo, algo que não tinha sido observado antes. Porém, ainda não sabemos quais os impactos dessas mutações. Por esse motivo, consideramos fundamental imprimir velocidade à divulgação dos achados, para que os diversos grupos de pesquisa do país que estão debruçados sobre o tema da febre amarela possam considerar esse aspecto em suas análises. A ciência se faz de forma colaborativa, com resultados que vão se somando.

Ainda segundo a fundação, considerando que há um número limitado de sequências genéticas completas de vírus da febre amarela das Américas depositados nos bancos de genomas internacionais, não está descartada a hipótese de que esta alteração genética seja mais antiga, e que o vírus com esta característica esteja circulando há mais tempo e não tenha sido identificado antes.

Sobre um possível impacto para a vacina disponível, os pesquisadores explicam que a vacina adotada na campanha contra a doença protege contra genótipos diferentes do vírus, incluindo o sul americano e o africano. Além disso, as alterações detectadas no estudo não afetam as proteínas do envelope do vírus, que são centrais para o funcionamento da vacina.

R7

O que você pensa sobre este artigo?

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.