Dom Pedro Conti: O homem certo na hora certa

No dia 19 de maio passado, aos 78 anos, faleceu, no mais completo esquecimento, o Sr. Stanislav Petrov, ex-tenente-coronel do exército soviético. Eram os anos da “guerra fria” e, no dia 26 de setembro de 1983, ele tomou uma decisão que salvou o mundo da terceira guerra mundial. Stanislav estava no turno de madrugada, no refúgio subterrâneo, trabalhando no computador Krokus, que monitorava todas as atividades dos mísseis americanos. Se Krokus desse algum sinal de movimentação, ele devia avisar imediatamente os superiores, os quais iniciariam o contra-ataque. Ele mesmo não teria aperta do o temido “botão vermelho”, mas contribuído para “armar” a mão de quem o faria. Tudo parecia tranquilo, mas, de repente, o computador central assinalou que um míssil tinha partido de uma base no Montana rumo à União Soviética. Petrov manteve a calma e procurou ganhar tempo: tinham-lhe dito que, se os Estados Unidos atacassem, o fariam de forma maciça. Portanto, aquele míssil solitário não o convenceu: podia ser um falso alarme. E não o convenceram, nem os sucessivos quatro que apareceram na sequência. Dos radares de terra também não chegavam confirmações. Aguardou mais um pouco, mesmo se não restava muito tempo: um míssil intercontinental empregava menos de meia hora para alcançar o objetivo e restariam só poucos minutos para contra-atacar. Por fim, sob os olhares aterrorizados dos outros presentes, Petrov assumiu a enorme responsabilidade de não dar o alarme. Teve razão, felizmente. Em seguida, descobriu-se que o “infalível” Krokus tinha se enganado. O ocorrido foi silenciado. Por sua ação, Stanislav não recebeu reconhecimentos na pátria. Já teve sorte de não receber punições por ter desobedecido às ordens. Quando, enfim, a história se tornou pública, ele recebeu algum prêmio no exterior. Já idoso, repetia: “O que fiz? Nada de especial, só o meu trabalho. Fui o homem certo na hora certa”.

O que tem a ver essa história verdadeira com o mandamento do amor que encontramos no evangelho de Mateus deste domingo? Talvez nada. Não conhecemos as motivações que levaram esse “salvador da humanidade” a agir assim. Não sabemos se teve consciência da sua responsabilidade; se desejava a paz mundial ou, simplesmente, não gostava de briga.  Também não sabemos se acreditava, ou não, em Deus. No entanto, podemos tirar algumas lições. A primeira é que o amor verdadeiro nunca é simplesmente um sentimento ou uma boa intenção; ao amor sempre corresponde alguma maneira de agir. A segunda lição é que, em geral, as nossas ações têm consequências, para bem ou para o mal, mesmo quando Deus e o próximo parecem não ter nada a ver, e o nosso agir insignificante, porque ninguém está vendo ou vai saber.

Esta, porém, é a maravilha e a grandeza do amor. Não precisa ser algo de extraordinário para ter valor. Basta acreditar que o bem sempre vale por si mesmo, que o respeito à vida, a promoção da dignidade humana, a sobrevivência de qualquer espécie e do planeta inteiro, sempre são importantes e valem em qualquer momento e em qualquer lugar. Os gestos heroicos, de quem salva vidas, são exemplares e merecem a nossa admiração, porque nos lembram que sempre devemos estar atentos e prontos a fazer o bem. Não precisa que pegue fogo uma creche para defender a vida das crianças de mil outras amea& ccedil;as. Não devemos aguardar um terremoto para reconstruir, depois, casas dignas e antissísmicas. Nem esperar o deslizamento de uma encosta para desmascarar a especulação imobiliária. Não serve ficar apavorados com as estatísticas do câncer para proibir, sempre tarde demais, o uso de certos remédios e venenos. O amor ao próximo se aprende aos poucos, através de pequenos gestos de amizade e solidariedade. Quando amamos a Deus de verdade aprendemos a pensar grande, porque ele ama a todos também através do nosso pequeno amor. Naquela hora, Stanislav Petrov, talvez, pensou simplesmente na vida dele e da sua família; sabia que uma guerra nunca seria boa, para ninguém. Pensou grande, porque pensou na vida. E Deus é sempre o Deus da Vida.

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