Eu sou é Belgicano

Eliminada hoje pela França, depois de mandar o Brasil pra casa na Copa da Rússia, a Bélgica tem há muitos anos um fiel, ardoroso e barulhento torcedor na rua José Serafim, no Laguinho, em Macapá. É duradoura e inexplicável paixão que vem atravessando Copas e torneios europeus.

Nas Copas, o ancião aposentado Evilázio da Silva é sempre voz dissonante, para que todos saibam por quem ele está torcendo. Apesar da idade avançada, abre os pulmões:

– Eu sou é “belgicano”! – grita para a vizinhança. rs.

Na partida com o Brasil, a idolatria falou mais alto e Evilázio não se importou em comemorar o avanço da ex-república soviética. Não zombava da derrota brasileira, mas aplaudia o triunfo belga com o entusiasmo de sempre.

-Eu sou é “belgicano!” – repetia. rs.

Ontem, mergulhado em tristeza, Evillázio sumiu do mapa depois da desclassificação belga. Os vizinhos a quem consultei após o jogo não o viram fazer o costumeiro alarido e atestaram a repentina reclusão do bom Evilázio. “Está escondido”, afiançou um vizinho que ajudou o cronista a saber a reação do torcedor canarinho-belga.

Estou investigando com os X-9 da rua José Serafim e adjacências para descobrir a origem da paixão belga desse tão cosmopolita torcedor, capaz de importar do longínquo norte da Europa a preferência futebolística e sabe-se-lá mais o quê para viver e alegrar o espírito.

Antes de se tornar eremita na própria casa, ele tomou a decisão mais acertada para afugentar os gozadores de plantão: arrancou toda a decoração preta, amarela e vermelha, as cores da Bélgica.

Sem vestígio de Evilázio na rua e no bairro, a ausência dele é compensada pelo brado nacionalista que ressoa nos corações solidários à decepção do meio belga, meio brasileiro:

– Eu sou é “belgicano!”

Quem vai contrariar?

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Euclides Farias é cronista e jornalista, 59 anos de idade e 40 de profissão exercida nos jornais Marco Zero (AP), O Liberal, A Província do Pará, Agência Nacional dos Diários Associados (ANDA), Rádio Cultura, Folha de S. Paulo e Jornal da Tarde. É editor de coluna no Diário do Pará.

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