Dom Pedro Conti: A flor e a borboleta
Certa vez, um homem pediu a Deus uma flor e uma borboleta, mas Deus lhe deu um cacto e uma lagarta. O homem ficou triste, pois não entendeu o porquê do seu pedido vir errado. Daí pensou: “Também, com tanta gente para atender!”. E resolveu não questionar. Passado algum tempo, o homem foi verificar o pedido que deixara esquecido, e, para sua surpresa, do espinhoso e feio cacto havia nascido a mais bela das flores. E a horrível lagarta transformara-se em uma belíssima borboleta.
Já disse, domingo passado, que a espera da volta do Senhor deve ser vigilante, atenta e ativa. A parábola dos talentos continua essa questão. Ela é bem conhecida e todos poderíamos fazer muitas considerações a respeito, porque está, no seu conjunto, debaixo dos nossos olhos. Todos os dias, encontramos pessoas ocupadas que usam muito bem dos dons e das capacidades que a natureza e o seu esforço lhes proporcionaram. Algumas conseguem fazer isso superando, muitas vezes, deficiência físicas ou outras limitações. São admiráveis pela dedicação. Outras pessoas são diferentes: parecem ser tomadas pela indolência, a preguiça e nunca tomam iniciativa para nada. Carecem de autonomia, dependem das decisões dos outros. Têm medo de Deus? Não, na verdade têm medo de serem criticadas. É obvio! Somente quem faz alguma coisa pode fazer certo ou errado. Quem nunca faz nada, também nunca errará. Qualquer ação, qualquer decisão ou empreendimento exige um mínimo de coragem e de disponibilidade a correr algum risco.
Até aqui a vida do dia a dia, na variedade infindável dos seres humanos, dos seus gênios e temperamentos. Mas Jesus não contou a parábola dos talentos para incentivar a poupança em algum banco. Precisamos fazer uma leitura espiritual dessa parábola extraordinária. Mais uma vez Deus, o verdadeiro senhor dos bens, os entrega largamente aos seus “empregados”. Ele, não somente é generoso, ele confia e viaja, para deixá-los livres de decidir. É maravilhoso. Ele quer “empregados” responsáveis, conscientes do valor dos b ens recebidos. Os que assim entendem, ficam felizes, partem para o bom uso dos dons recebidos, trabalham e os dons se multiplicam.
Podemos pensar na nossa própria vida, nas nossas capacidades, no planeta Terra, na inteligência e criatividade humanas. Quantas coisas surpreendentes o ser humano já fez e ainda vai fazer. No entanto, nem tudo o que fazemos multiplica o bem comum e a alegria de todos. O homem já fez e faz também guerras, inventa armas e remédios para matar o seu semelhante, disputa o que é de todos, para seu uso particular, deixando povos inteiros sem alimentos e sem água para sobreviver. O servo da parábola, que enterrou o talento, foi chamado de “mau, preguiçoso e in útil”. Como poderíamos chamar aqueles que escravizam países por causa das dívidas, apavoram com a violência populações inteiras e as obrigam a deixar as suas casas, deixam morrer crianças inocentes pela fome e a miséria? Trabalham muito, mas só para aumentar sem fim o seu lucro. Quanto sofrimento no mundo depende do mau uso dos bens entregues à humanidade, herdados dos antepassados e construídos por outros. Bens que, afinal, todos teremos que deixar, um dia. Como cristãos, temos a obrigação de consciência de fazer bom uso das nossas forças e capacidades, seremos julgados sobre o bem feito aos irmãos necessitados.
Às vezes, porém, nós também desanimamos, parece-nos uma tarefa impossível ou uma exigência infindável. Temos a impressão de que seja o mal a se multiplicar e não o bem. Temos medo de estarmos no caminho errado vendo avançar o poder do dinheiro, das armas, das ideologias contrarias à vida, à dignidade humana e à liberdade das pessoas. Estamos esquecendo de que não tem vida nova, a ressurreição, sem a morte de cruz, sem abandono do homem velho egoísta e interesseiro, violento e rancoroso. O bem sempre afasta o m al, o belo apaga a feiura, a vida vence a morte. Somos somente pequenos colaboradores do grande projeto do reino de Deus. Um dia veremos o cacto florescer. Vai
perfumar! E a lagarta se tornará borboleta. Vai voar! Sem medo.