PF prevê novos indiciamentos pela tragédia de Brumadinho só após junho
Dia 25 de janeiro desmoronamento de barragem da Vale completa 1 ano
De acordo com a Polícia Federal (PF), novos indiciamentos decorrentes das investigações da tragédia de Brumadinho (MG) não devem ocorrer antes de junho. Um balanço dos trabalhos foi apresentado hoje (16), nove dias antes do rompimento da barragem da mineradora Vale completar um ano.
Em setembro do ano passado, já havia sido anunciado o desmembramento dos trabalhos e 13 pessoas foram indiciadas por falsidade ideológica e uso de documentos falsos: sete eram funcionários da Vale e seis da consultoria Tüv Süd, empresa alemã que assinou laudo atestando a estabilidade da barragem. A apuração de crimes ambientais e contra a vida tiveram sequência. Segundo a PF, o indiciamento por homicídio depende da conclusão da perícia de engenharia que esclarecerá quais os motivos da ruptura da barragem.
“Há uma estimativa de que esta perícia seja concluída até junho, mas gostaria de ressalvar que ela começou efetivamente após o fim da coleta de dados, no mês de dezembro”, afirma o delegado Luiz Augusto Pessoa Nogueira, chefe das investigações e da Delegacia de Prevenção aos Crimes contra o Meio Ambiente. “Somente a partir daí poderemos dizer se houve crime de homicídio, seja doloso ou culposo”, esclareceu.
Desde a tragédia, ocorrida em 25 de janeiro do ano passado, 259 corpos foram resgatados. A maioria dos mortos eram trabalhadores da própria Vale ou de empresas terceirizadas que prestavam serviço para a mineradora. Permanecem desaparecidas onze pessoas e o Corpo de Bombeiros prossegue com as buscas. A avalanche de lama também destruiu comunidades, devastou vegetação e poluiu o Rio Paraopeba, que abastece parte da região metropolitana da capital mineira.
O grande desafio, segundo a PF, é esclarecer qual foi o gatilho da liquefação, isto é, o que fez com que o rejeito, que estava sólido dentro da barragem, se convertesse em fluido. Para alcançar essa resposta, parcerias têm sido firmadas fora do país. Em novembro do ano passado, com intermediação do Ministério Público Federal (MPF), foi anunciado um acordo com a Universidade Politécnica da Catalunha, sediada em Barcelona, na Espanha. Pesquisadores da instituição estrangeira estão responsáveis por um trabalho de modelagem e simulação por computador para identificar as causas do rompimento da barragem.
De acordo com o delegado, é uma perícia extremamente complexa para qualquer laboratório no mundo. “São dados de satélites, de todos os instrumentos de monitoramento que estavam instalados na estrutura, de estações sismográficas. Precisa montar um quadro completo para poder, com todas essas informações, identificar o que causou a liquefação”.
Avanços
Apesar das dificuldades, a PF anunciou alguns avanços nas investigações. Segundo Luiz Augusto, foram demandadas mais de 40 perícias, sendo sete dedicadas exclusivamente a questões ambientais e três especificamente envolvendo detalhes de engenharia. Também foram solicitadas contribuições de diversos órgãos públicos.
O delegado informa que em um parecer técnico do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), por exemplo, foram identificados 10 sítios arqueológicos parcialmente ou totalmente destruídos. Ele diz também que as investigações já comprovaram que houve contaminação inclusive de lençóis freáticos. Além disso, em computadores e celulares apreendidos em endereços relacionados aos suspeitos, foram recuperados dados importantes que haviam sido apagados ou estavam corrompidos. Mais de 80 milhões de arquivos foram juntados e o material está em análise, incluindo conversas realizadas em aplicativos.
A PF também revela que uma perícia identificou quatro detonações ocorridas no dia 25 de janeiro, entre 12h e 13h, num raio de 150 quilômetros da barragem. O rompimento se deu às 12h28. Mas, segundo o laudo, nenhuma dessas explosões foi responsável pela desestabilização da estrutura. De outro lado, está sendo investigado se os mais de 150 sismos registrados ao longo de 2018 na área de barragem podem ter provocado progressivamente a desestabilização.
Nomes de suspeitos não foram divulgados. Um complicador, segundo a PF, é a ausência do executivo alemão da Tüv Süd, Chris-Peter Meier. Ele trabalha sediado na Alemanha e já informou que não pretende vir ao Brasil para prestar depoimento. A PF considera que ele cumpriu papel importante no processo de elaboração do laudo de estabilidade da barragem.
Chris-Peter Meier é inclusive um dos 13 indiciados no inquérito que envolveu os crimes de falsidade ideológica e uso de documentos falsos. Este primeiro inquérito foi concluído com 27 volumes que somam mais de 6,5 mil folhas, além de 16 apensos. O segundo inquérito, que está em andamento, já possui sete volumes e mais de mil folhas.
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CPIs
Responsabilidades em torno da tragédia já foram investigadas em relatórios de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), instaladas no Senado, na Câmara dos Deputados, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e nas Câmaras dos Vereadores de Brumadinho e Belo Horizonte. Os documentos foram encaminhados para órgãos públicos como o MPF e o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que têm a atribuição de formular denúncias à Justiça.
A primeira CPI a concluir os trabalhos foi a do Senado, que pediu, em julho, o indiciamento de 14 pessoas pelo crime de homicídio com dolo eventual. A Vale e a Tüv Süd, empresa que atestou a estabilidade da barragem, também foram indiciadas. Os trabalhos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais e da Câmara dos Deputados foram os que mais se estenderam, resultando em relatórios densos. O documento aprovado pelos deputados estaduais, por exemplo, teve mais de 300 páginas e pediu o indiciamento de 13 pessoas por homicídio e lesão corporal com dolo eventual, entre outros crimes.
Já a CPI conduzida pelos deputados federais, a última a ser concluída, pediu o indiciamento da Vale, da Tüv Süd e de mais 22 pessoas das duas empresas por homicídio doloso, lesão corporal dolosa e poluição ambiental por rejeitos minerais com sérios danos à saúde humana e ao meio ambiente, além de destruição de área florestal considerada de preservação permanente. Conforme o relatório final, há elementos para que dizer que a barragem apresentava condições de se romper devido a quatro processos: galgamento, erosão interna e cisalhamento tanto da condição drenada como da condição não drenada.
EBC