Dom Pedro José Conti: Crescendo com os desafios
Um velho fazendeiro veio a Deus e lhe disse: – Olha, você pode ter criado o mundo, mas não é fazendeiro. Não sabe nem o bê-á-bá da agricultura. Você tem muito a aprender. Ao que Deus respondeu: – O que você sugere? – Dê-me um ano de tempo e permita que as coisas sejam de acordo com a minha vontade. Verá o que vai acontecer. Deus concordou e deu um ano ao fazendeiro. Este pensava no melhor, nada de trovões, ventos fortes, nenhum perigo para a safra. Tudo confortável. Quando queria sol, havia sol. Quando queria chuva, havia chuva, o tanto que quisesse. O trigo crescia depressa. Uma maravilha! Naquele ano, tudo dava certo. Seria a maior safra de grão nunca vista. No entanto, quando fizeram a colheita, a surpresa foi muito grande: as espigas estavam vazias. O fazendeiro ficou triste e perguntou a Deus: – O que aconteceu? O que saiu errado? E Deus lhe respondeu: – Por não existir desafios, conflitos, esforços, já que você evitou tudo isso, o trigo não trabalhou, ficou acomodado. Para crescer, precisa tempo e paciência. O sol, as tempestades, os trovões e os raios fazem o trigo reagir. É só assim que ele cresce forte, resistente e cheio de vida.
Com o Terceiro Domingo da Quaresma, iniciamos as leituras próprias deste ano. O grande assunto, que aparecerá ainda mais claramente a cada domingo, é um dos temas mais trabalhados pelo evangelho de Lucas: a misericórdia de Deus. Tudo começa com uma questão levantada a partir de dois casos que deviam ser comentados pelo povo. Um deles lembrava a matança de alguns galileus por ordem de Pilatos, e o outro, a queda de uma torre com a morte de dezoito pessoas. Muitos acreditavam numa justiça divina de tipo “retributivo”, ou seja, Deus castiga os pecadores e recompensa os justos. Se fosse assim, os que morreram pagaram, afinal, pelos próprios pecados e os que tinham sobrevivido deviam ser considerados mais agradáveis a Deus que os mortos. Essa dúvida sempre volta quando acontecem acidentes, calamidades ou desastres onde há algumas vítimas fatais e outros sobreviventes.
Por que essa diferença? Não temos resposta simples. A pergunta perde mais sentido ainda quando entre as vítimas, por exemplo, têm crianças que devem ser consideradas absolutamente inocentes. Jesus, de fato, não responde à questão da culpabilidade, ou não, das vítimas. Simplesmente lembra que a vida humana tem um limite. Não sabemos quando, mas todos vamos morrer de um modo ou de outro. Essa é a herança que deveria, inclusive, tornar-nos mais solidários e fraternos, porque somos companheiros de viagem e passamos poucos dias nesse caminhar juntos. A vida é um dom que devemos gastar da melhor maneira possível. Por isso, Jesus conta a parábola de uma figueira que, havia três anos, não produzia frutos. O patrão mandou que a árvore fosse cortada, porque era inútil, somente ocupava o terreno. O responsável pela plantação, porém, sugeriu aguardar mais um ano de tempo. Ele se comprometeu a cavar ao redor dela e a colocar adubo. Se, passado o tempo, ainda não aparecessem os frutos, o dono podia cortá-la. Mais uma vez, com a sua sabedoria, Jesus muda a questão.
Qualquer que seja a duração do tempo da nossa existência humana, ela deve ter um sentido, deve servir para alguma coisa, deve produzir algum fruto bom. Com efeito, os figos são frutos doces e gostosos e assim deveria acontecer com toda figueira “produtiva”. Onde está a misericórdia de Deus? Sem dúvida, nos dias ao longo da nossa vida, nas incontáveis possibilidades de fazer o bem que todos temos. No entanto penso, sobretudo, em tantos irmãos e irmãs que, por algumas circunstâncias, nascem ou acabam tendo que conviver com alguma deficiência. A vida deles e delas é uma luta contínua de superação e muitas vezes conseguem façanhas que tantos outros, cheios de saúde e capacidades, nem imaginam. Também defeitos e dificuldades “espirituais” podem nos estimular a crescer no serviço e no amor. Talvez o mais triste de uma existência humana não sejam os desafios, mas o medo e a preguiça de enfrentá-los. Quantos “frutos” de bem não brotam por comodismo ou por termos, simplesmente, o coração vazio.