ONG pede veto às MPs que reduzem áreas protegidas na Amazônia
Por Daniele Bragança
O futuro de 600 mil hectares de áreas protegidas na Amazônia (e uma em Santa Catarina) está nas mãos do presidente Michel Temer. O chefe do Executivo poderá sancionar ou vetar, parcial ou integralmente, as duas Medidas Provisórias que reduziram Unidades de Conservação na Amazônia localizadas ao longo da BR-163. Na segunda (29/05), o WWF-Brasil enviou uma carta em que pede o veto integral do que chama de retrocesso ambiental.
“As medidas aprovadas abrem precedente para novas ocupações de áreas preservadas em Unidades de Conservação na Amazônia, que ficarão ainda mais vulneráveis a crimes ambientais, como grilagem, garimpo e extração ilegal de madeira”, afirma o diretor executivo do WWF-Brasil, Maurício Voivodic.
Aprovadas há uma semana, as Medidas Provisórias 756/2016 e 758/2016 alteraram os limites das Florestas Nacionais de Jamanxim (PA) e Itaituba II (PA) e dos Parques Nacionais do Jamanxim (PA) e São Joaquim (SC). As MPs também criaram duas novas Áreas de Proteção Ambiental (APA de Jamanxim e APA Rio Branco), categoria mais branda de Unidades de Conservação, que permite propriedades privadas e exploração produtiva dentro de seus domínios.
Na prática, quase 600 mil hectares de áreas protegidas foram reduzidas ou tiveram sua proteção flexibilizada. Segundo o WWF-Brasil, a perda refere-se a uma área equivalente a quatro vezes o município de São Paulo, ou o território do Distrito Federal.
Além da WWF-Brasil, já se pronunciaram pelo veto a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura – que reúne empresas, ONGs e academia e o próprio Ministério do Meio Ambiente.
Leia a íntegra da carta:
Excelentíssimo Senhor,
Em nome da Rede WWF, que tem quase cinco milhões de associados distribuídos em cinco continentes, dirigimos à vossa Excelência para expor nosso posicionamento e motivação para, ao final, requerer o Veto integral às Medidas Provisórias 756/2016 e 758/2016 por contrariedade ao interesse público ao apresentar sérios riscos ao futuro da Amazônia brasileira.
Se essas medidas forem aprovadas na sua integralidade, teremos uma redução total de quase 600 mil hectares de florestas protegidas, que pertencem a Unidades de Conservação cujo objetivo prioritário é a manutenção da biodiversidade, componente imprescindível na estratégia de preservação de habitats naturais, espécies em risco de extinção e mitigação das mudanças climáticas.
Além disso, a redução de áreas protegidas na Amazônia por meio de medidas provisórias deixará uma marca negativa em sua gestão como presidente do Brasil, pois vai na contramão das expectativas da sociedade brasileira e internacional, altamente preocupada com a proteção da floresta amazônica – que é fundamental para a manutenção do equilíbrio climático do planeta.
Com a aprovação da MP 756, a Floresta Nacional (Flona) de Jamanxim perderá 37% da sua área total, sendo que no último ano teve a maior taxa de desmatamento, comparada a todas as Unidades de Conservação federais. Essa enorme redução dará um sinal negativo à sociedade, abrindo um precedente perigoso para a grilagem e ocupação irregular de novas áreas preservadas. E o governo brasileiro não pode premiar aqueles que atuaram na ilegalidade.
Temos orgulho em dizer que a mais ambiciosa iniciativa de conservação de florestas tropicais da história da humanidade é brasileira. O programa ARPA, sigla de “Áreas Protegidas da Amazônia”, foi criado com o protagonismo e a liderança do governo brasileiro, representado pelo Ministério do Meio Ambiente em 2002. Sob a batuta do governo brasileiro, este programa único apenas pôde ser criado graças à uma orquestração muito efetiva de interesses que permitiu que doadores e apoiadores de natureza tão diversas – o WWF, Fundações privadas e agências de governo e multilaterais, como o BID, o KW e o GEF, – pudessem se unir e doar recursos ao redor de um acordo único.
Esta cooperação gerou recursos para a conservação durante muitos anos e culminou, em maio de 2014, no lançamento de um fundo privado para apoiar atividades dos governos federal e estaduais no âmbito do ARPA, num total de US$ 215 milhões destinados a garantir a sustentabilidade financeira de longo prazo de uma área imensa de áreas protegidas de florestas na Amazônia – 60 milhões de hectares. A redução de áreas protegidas na Amazônia pode colocar o ARPA em risco e abalar a confiança internacional na capacidade do Brasil de proteger suas florestas.
De fato, acreditamos que a aprovação das MPs 756 e 758 prejudica a aplicação de políticas nacionais estratégicas, como o Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento na Amazônia (PPCDAM) e o alcance dos compromissos globais aos quais o Brasil é signatário. Este tipo de ação vai tornar muito mais difícil a árdua tarefa brasileira de cumprir com seus compromissos internacionais, em especial na área de clima (o NDC brasileiro) e em biodiversidade.
Finalizamos com a certeza de que a aprovação destas MPs sinaliza aos doadores internacionais uma fragilização da governança ambiental brasileira no que toca à conservação da Amazônia. Desta forma, o WWF-Brasil solicita à vossa Excelência o veto integral às MPs 756 e 758, que alteram significativamente o status de conservação da região atualmente mais ameaçada da Amazônia brasileira.
Agradecemos sua atenção e compromisso com a sociedade brasileira.