Educação e alfabetização bilíngue dividem opiniões

Especialistas discutem as diferentes formas de aprendizagem e o que pode ou não ser benéfico para as crianças

JULIANA SIQUEIRA

Hoje em dia, falar sempre a mesma língua já não é mais algo tão comum assim – que o digam os diversos cursos e escolas que focam idiomas diferentes daqueles que são próprios de determinado país. Agora, quando se trata de falar a mesma língua a respeito da educação e da alfabetização bilíngue, a questão se torna ainda mais complexa, tornando essa possibilidade praticamente impossível.

São vários os tipos de pensamento a respeito do assunto. Há quem defenda que, desde muito nova, a criança já começa a ter contato não só com uma, mas com várias línguas diferentes, uma vez que é um momento da vida que a torna mais apta a aprender. Em contrapartida, existem também aqueles profissionais que dizem não ser algo necessário ou mesmo que isso pode, de certa forma, acabar sobrecarregando os pequenos.

“Eu acredito que a educação bilíngue faz sentido em alguns casos, como quando a criança é filha de um profissional que precisa se mudar constantemente de país. No entanto, na maioria das vezes, entendo que não adianta colocar o filho em uma escola bilíngue se ele não está inserido nesse universo socialmente. A criança pode sofrer muito. Quando todos os conteúdos são dados em outro idioma, você tira o direito de um aluno aprendê-los em sua língua materna, o que pode ser algo desconfortável para ele. É uma imposição desnecessária”, defende Vera Menezes, doutora em linguística e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Já para Marcus Vinícius Leite, diretor didático brasileiro da Fundação Torino Escola Internacional, que trabalha com o plurilinguimo (desde os 2 anos as crianças na instituição já começam a ter contato com o português, o italiano e o inglês e, posteriormente, na pré-adolescência e adolescência, com o espanhol e com o latim), o aprendizado acontece de maneira natural, sendo que a criança transita de uma língua para a outra com facilidade. “É um modelo de ensino mais adaptado a essa realidade do mundo globalizado, que precisa de um cidadão com formação mais ampla. Tudo é feito de uma maneira leve, lúdica, mas dentro do padrão de uma atividade normal. O que enxergamos são muitos benefícios”, diz.

Dia a dia. E, se o assunto envolve também a forma como o ensino é trabalhado, Rita de Cássia Miranda, coordenadora do programa bilíngue do Colégio Batista Mineiro, ressalta que na instituição, com os pequenos, são utilizados jogos, brincadeiras e diversos recursos lúdicos para despertar o encantamento por outras línguas. No entanto, a alfabetização acontece somente no português, e depois é que há a transferência do conhecimento adquirido para outro idioma. “Isso é feito até por uma questão de maturidade. Para a criança, é tudo muito bê-á-bá. Ela escreve ‘late’, por exemplo, mas precisa ler ‘leit’. Isso pode acabar confundido-a em relação ao português”, diz a profissional.

Já para Alessandra Latalisa, professora de pedagogia da Universidade Fumec, o bom resultado no assunto pode depender mais do tipo de alfabetização do que do fato de ela ser bilíngue, existindo, assim, benefícios próprios em cada um. Ela acredita, no entanto, que o ensino precoce de outra língua não é sinônimo de desenvolvimento de competências para aprendizagem. “Uma criança pode não estar exposta a uma segunda língua, mas estar em contato com outros tipos de linguagem, como a arte, a brincadeira, a expressão pela dança ou pelo desenho, e isso também é muito importante. No fim, depende muito do que as famílias estão procurando para os seus filhos”, finaliza.

Para pequenos, desafios não são problemas

“Eu aprendo três línguas: português, italiano e inglês”, diz Stella Bretas, 7. Ela conta, orgulhosa, que inclusive ajuda a mãe e a tia em alguma dúvida que elas têm com outro idioma e que nem mesmo se lembra de quando começou a aprender algo além do português.

A mãe da criança, a administradora Regina Bretas, relata que, observando a filha, percebe que, para ela, o aprendizado é muito mais simples do que é para um adulto. “Nós criamos o filho para o mundo, e ele não tem uma língua só. Ela fica empolgada com o aprendizado. Se comete algum erro, não sofre com ele, uma vez que são comuns para qualquer criança que está aprendendo a escrever”, diz.

E, como em todo processo de ensino, existem também os desafios. Stella conta, por exemplo, que algumas coisas são mais difíceis de aprender. “Mas são mais difíceis ou mais legais?”, perguntamos. “Mais legais”, responde ela prontamente.

O Tempo

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