Projeto de regularização fundiária divide opiniões na Câmara
Medida provisória sobre o assunto perde validade nesta terça-feira
O debate sobre o projeto de Lei (PL) 2633/20, que trata da regularização fundiária de imóveis da União, incluindo assentamentos dividiu opiniões durante uma reunião virtual temática para tratar da matéria na Câmara dos Deputados, nesta segunda-feira (18). Se não for votada, a MP perde a validade amanhã (19).
O projeto, que substitui a Medida Provisória (MP) 910/19, determina que as regras para a regularização serão aplicadas a áreas com até seis módulos fiscais e ocupadas até julho de 2008. O módulo fiscal é uma unidade fixada para cada município pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que varia de 5 a 110 hectares.
Na semana passada, a MP chegou a ser incluída na pauta de votação, mas não houve acordo e a proposta foi retirada de pauta. Na ocasião, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) anunciou que o texto do projeto seria colocado na pauta de votação desta semana.
Vistoria prévia X sensoriamento remoto
Entre os pontos polêmicos do projeto estão o que estabelece a dispensa de vistoria prévia pelo Incra para a regularização fundiária das áreas de até seis módulos fiscais. Pelo texto, o processo de vistoria seria executado por meio de sensoriamento remoto.
De acordo com o autor do projeto, deputado Zé Silva (Solidariedade-MG), o uso da tecnologia simplifica o processo e minimiza o impacto da falta de servidores do Incra para realizar o procedimento. “No início dos anos 1990 o Incra chegou a ter quase 10 mil funcionários e hoje tem apenas 30% desses profissionais. O sensoriamento remoto vai permitir ao Incra cumprir seu papel com celeridade”, disse.
O deputado defendeu ainda o marco de ocupação da terra até 2008, como forma de desestimular a grilagem de terras. “O Brasil precisa mandar uma mensagem para nós mesmos e para o mundo de que não pode ocupar terra que, de tempos em tempos, o governo manda um projeto para regularizar. A mensagem é muito clara: não vale a pena ocupar terras públicas de forma ilegal”, afirmou.
O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Amazonas, Muni Lourenço, disse que o sensoriamento remoto vai simplificar o processo de regularização e defendeu a ampliação do limite de módulos fiscais para 15. Lourenço disse ainda que o setor defende que o marco temporal para a ocupação de terras seja estendido de 2008 para 2012.
“O quantitativo de 15 módulos fiscais contempla a prioridade com os pequeno [produtores], mas também tem um foco importante para os médios produtores”, disse.
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Déficit de regularização
De acordo com o professor de Gestão Ambiental do Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal de Minas Gerais, Raoni Rajão o projeto pode ser aplicado em até 150 milhões de hectares que hoje se encontram registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR), áreas requeridas ou áreas que não foram requeridas ou não foram destinadas a um uso específico.
“É preciso reconhecer que existe um passivo dentro do Incra aguardando reglarização. Temos 108 mil imóveis em análise e nos últimos 11 anos apenas 24 mil títulos foram concedidos”, afirmou.
Rajão disse que o PL avança em reconhecer o déficit na regularização das terras, mas que um possível aumento no limite mínimo de regularização para até 15 módulos fiscais pode facilitar a atividade de grileiros.
“É possível ver que existe uma tendência muito grande de definir grandes conjuntos de áreas que têm características de ser do mesmo imóvel e que acabam sendo parcelados em 15 módulos fiscais para entrar nessa modalidade [de regularização] que inclui poucas propriedades”, disse. “Existe um grande risco de grilagem de terras públicas, já é possível encontrar na internet pessoas que estão fazendo o anúncio dessas terras”, acrescentou.
O relator do projeto, deputado Marcelo Ramos (PL-AM) defendeu o limite de seis módulos fiscais. Segundo ele, esse limite vai abranger até 92% das propriedades que estão em terras públicas e que são passíveis de regularização. Ramos disse que são 827 mil imóveis que podem ser titulados. Desse total, 272 mil estão na Amazônia Legal; 31.333 na Região Nordeste; 5.537 no Centro-Oeste; 127.921, na Região Sul e 20.443 no Sudeste.
“Há uma tentativa de dizer que o texto não resolve em nada do problema fundiário do Brasil […] Dizer que um projeto que atende 92% das propriedades rurais em terras da União não resolve nada, não me parece algo sustentável”, afirmou.
Segundo o deputado, o projeto diz ainda que a vistoria por meio de sensoriamento remoto será aplicada apenas as áreas com até seis módulos. As que forem maiores terão que cumprir exigências adicionais. “O projeto não veda a titulação dessas áreas. Ele apenas diz que para imóveis acima de seis módulos fiscais é necessário a vistoria física do Incra”, disse.
Já o deputado Vilson da Fetaemg (PSB-MG), disse que o tema é complexo e criticou a a possibilidade de votação da matéria nesta semana.
“Esse projeto não pode ter pressa nesse momento. É uma matéria muito complexa e não deve ter essa pressão da bancada ruralista para votar esse projeto em pouco tempo. Penso que a proposta pode ser debatida, mas não votada nesse momento, deveríamos estar debatendo matérias relacionadas a covid-19”, opinou.
EBC