Dom Pedro José Conti: O cavalo bravio

Dom Pedro José Conti

Bispo de Macapá

 

Um camponês simples, sincero e de bom coração, foi desabafar com o seu pároco. Estava triste porque sentia um mau impulso que o dominava e o arrastava sempre ao pecado.

– Sabes montar a cavalo? – perguntou-lhe o padre.

– Sei – respondeu prontamente o homem – e sou muito bom nisso. Sei até lidar com cavalos bravios.

– O que fazes se, por acaso, cair do cavalo, vais desistir?

– Nunca! Eu monto nele outra vez – rebateu o camponês, tranquilamente e com certo orgulho, como alguém acostumado com a lida.

– Pois bem: faz de conta que o teu mau impulso seja o cavalo – falou o padre com ar de inteligência – se caíres, outras vezes, nunca desiste, começa sempre tudo de novo. Deus tem mais paciência do que nós. Um dia amansarás o teu impulso!

Neste domingo, encontramos mais uma parábola de Jesus. De novo alguém precisa trabalhar numa vinha. Dessa vez, os trabalhadores convidados são os dois filhos de um homem. O primeiro, pelas suas palavras, recusa-se a ir para a vinha, mas, depois, arrepende-se e vai. O segundo declara prontamente a sua obediência, mas não sai para trabalhar. A parábola acaba aqui. Jesus a complementa com uma pergunta polêmica aos sumos sacerdotes e aos anciãos do povo, seus ouvintes: “Qual dos dois fez a vontade do pai?” Eles, sempre em busca de pegar Jesus em alguma contradição, percebendo ou não a esperteza dele, respondem o certo: “O primeiro”. Com efei to, este filho, apesar de ter declarado o contrário, foi o único a obedecer ao pai. Jesus aproveita da resposta deles e não perde a oportunidade para desmascarar a dureza dos seus corações. Eles se parecem mesmo com o segundo filho. Disse palavras bonitas, mas, na prática, não deu ouvido ao chamado do pai. Ao contrário, os cobradores de imposto e as prostitutas, julgados por eles tão pecadores, acreditaram na pregação de João Batista, arrependeram-se e mudaram de vida.

Daqui para frente, o embate entre Jesus e os chefes do Templo e do Sinédrio se fará, cada vez mais, acirrado. O desfecho será a condenação à morte dele na cruz. Uma briga desigual que a Jesus, porém, não interessa vencer. No Calvário, perdoará a todos. O Filho que o Pai enviou aceitará ser contado entre os malfeitores, será vítima inocente de um processo manipulado, “pecado” com os pecadores e morrerá por amor para salvar a todos. Ele tomará o remédio amargo da Paixão para que os doentes pudessem ser curados uma vez por todas. O que preocupa Jesus, também quando usa palavras duras e polêmicas, é a incredulidade daqueles que deviam ser os mais atentos, os mais próximos e preparados. A questão é que, para procurar o médico e pedir a cura, todos precisamos reconhecer que estamos doentes. Quem só vê os erros dos outros e os condena sem piedade em nome de uma Lei divinizada, dificilmente reconhecerá as suas próprias dificuldades, desobediências e hipocrisias.

 O interessante da parábola é que os dois são igualmente filhos, porque só assim pode ser para um pai. Nem o desobediente deixa de ser filho. As palavras de Jesus sempre foram, e sempre serão, para todos. O convite é dele, mas a resposta é nossa, de cada filho. A diferença entre os filhos depende das nossas respostas para participar do Reino. Ninguém é forçado ou obrigado. O Pai não é um patrão explorador, deixa livres os seus filhos. Tão livres que podemos aceitar ou não, mas também podemos nos arrepender e fazer, outra vez, o que, no momento, tínhamos recusado. Só a paciência e a miseric&oac ute;rdia do Pai podem ser tão grandes e nos dar tantas chances. Que bom seria sempre responder ao chamado com presteza e gratidão. Que bom seria abraçar a causa do Reino, sem julgar os acomodados e os atrasados, mas também sem nos achar indignos por causa dos nossos defeitos e pecados. Na vinha do Senhor tem trabalho para todos. A participação na comunidade de Jesus já é cura, é ar novo, horizonte novo para quem vivia afastado, às margens, porque se considerava melhor do que os outros ou, ao contrário, inútil para o serviço do Reino. A experiência de cair faz parte da vida de todos. O que vale é nunca desistir e sempre recomeçar.

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