Dom Pedro Conti: “Na plenitude dos tempos” (Gl 4,4)
No Natal, nós, cristãos contemplamos e celebramos o nascimento de uma criança que, acreditamos, ser o Filho de Deus Pai, obra do Espírito Santo no seio da virgem Maria. Jesus é verdadeiramente Deus e homem, sem mistura ou confusão. Uma só pessoa, a divina, mas com duas naturezas: a divina, desde sempre, e a humana, assumida na encarnação. Tudo isso aconteceu na “plenitude dos tempos” (Gl 4,4) ou, em outra tradução: “quando se completou o tempo previsto&rdquo ;. Foi somente por amor à humanidade que Deus Trindade realizou essa obra uma vez por todas. João, no seu evangelho, diz: “Deus amou tanto o mundo que enviou o seu Filho…não para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele” (Jo 3,16-17). O tempo de hoje, também é “salvo”. Não tem tempos piores ou melhores, só para reclamar ou ter saudade. Para nós cristãos, qualquer momento, qualquer época é ocasião de salvação, de transformação e de esperança. O “reino de Deus” que Jesus veio inaugurar acontece, aqui e agora, porque já está entre nós (Lc 17,20-21). A todos os batizados, a todos aqueles e aquelas que entendem o que significa ser “sal da terra e luz do mundo”, aos que buscam o reino antes de tudo (Mt 6,33), cabe a missão de torná-lo visível, experiment&aa cute;vel, acreditável.
Alguns entre nós, os saudosistas, acham que o tempo bom foi só no passado. A eles, eu pergunto: se fosse possível voltar atrás, topariam fazê-lo? Era mesmo tão bom assim? Tudo funcionava a contento? A humanidade avançou em muitos campos e, talvez, piorou em outros, mas pode ser que estejamos idealizando demais os tempos de outrora, que deixaram também marcas de sofrimentos e exclusão. Outro grupo de pessoas vive já no futuro, naquele mundo imaginário, onde a tecnologia faz aco ntecer coisas inacreditáveis. Já enxergam uma humanidade onde os robôs, máquinas com inteligência artificial, tomarão conta do trabalho e da produção. Os seres humanos verdadeiros, não terão mais nada para fazer, servidos com todas as mordomias por escravos cibernéticos. Deixaremos também de pensar e sonhar? Seremos livres? Quem decidirá por nós? Enfim, tem uma boa turma que já construiu o seu mundo virtual. São aqueles que vivem conectados 24 horas por dia, trocam mensagens a todo instante, têm mais amigos “virtuais” que em carne e ossos. Esses correm o perigo de achar que também as suas famílias, os doentes e os pobres sejam virtuais. Nenhum desses mundos existe.
Na “plenitude dos tempos”, Jesus se encarnou num mundo real, que também não era perfeito. Aliás, foi justamente por isso que veio no meio de nós, para transformar esta realidade e reconduzi-la ao primeiro projeto do Pai com o ser humano, criado a imagem e semelhança dele. Jesus não se conformou. Denunciou o pecado, mas perdoou os pecadores. Rejeitou a falsa apresentação de Deus, juiz implacável, que premiava os cumpridores de uma lei fria e sem compaixão e castigav a os infratores com doenças e pobreza. Exultou de alegria e louvou ao Pai, porque se revelava aos pequenos e aos humildes e se escondia dos soberbos e orgulhosos. O seu sangue na cruz não foi ficção, foi igual ao sangue de todos os mártires do bem, da justiça e da verdade. A sua ressurreição, iluminada pelo dom do Espírito Santo, transformou um pequeno grupo de homens e mulheres apavorados, numa comunidade de irmãos e irmãs, exemplo de partilha e fraternidade. A sua Vida Nova e Plena começou a correr nas veias de uma nova humanidade. Este nosso tempo não é nem melhor e nem pior do que os outros, é o “nosso” tempo, é o tempo atual, da nossa vida que passa. Cabe a nós torná-lo um tempo bom, o tempo do Reino, o hoje do amor. Não serve nos refugiarmos no passado, lamentando o presente. É inútil pensar de viver num mundo im aginário só porque temos novas tecnologias ou muros que nos separam da situação pobre e sofrida dos demais. Como cristãos somos responsáveis, devemos ser “sal da terra e luz do mundo” (Mt 5,13-14). Desta época, desta terra, deste país. Porque foi neste mundo que Jesus nasceu, viveu, morreu e ressuscitou. Ele é a nossa luz e a nossa esperança.
Feliz Natal de Jesus!