Dom Pedro José Conti: “Se eles se calarem, as pedras gritarão”   

Com essas palavras, conclui-se a leitura do evangelho de Lucas deste Domingo de Ramos. O proclamaremos lembrando a entrada de Jesus em Jerusalém. O povo aclamava: “Bendito o Rei, que vem em nome do Senhor!” (Lc 19,38). Alguns fariseus pedem que Jesus os repreenda. Ele não o faz. Dali a alguns dias, Jesus será mesmo “rei”, mas muito diferente dos reis deste mundo. O seu trono será a cruz e na cabeça terá uma coroa de espinhos. Por isso, na liturgia deste domingo, escutaremos, em seguida, a leitura da Paixão do Senhor, sempre acompanhando, neste ano, o evangelho de Lucas.

Em qual rei o povo pensava? Talvez um rei manso e humilde segundo a profecia de Zacarias (Zc 9,9) ou como Salomão, montando, sim, a mula do pai Davi (1Rs 1,33), mas rico e poderoso. Com efeito, no livro do Eclesiastes encontramos alguém que se apresenta como se fosse Salomão, grande sábio, filho de Davi e rei de Israel. Vale a pena conferir o que está escrito: “Multipliquei minhas atividades: construí casas e plantei vinhas; cultivei jardins e pomares, enchendo-os com árvores de toda espécie de frutos; construí reservatórios de água para regar o bosque das árvores que germinavam. Adquiri escravos e escravas e tive grande criadagem, tive também gado e grandes rebanhos de ovelhas, mais do que todos os que me precederam em Jerusalém. Acumulei para mim, também, prata e ouro, e riquezas dos reis e das províncias…Tudo o que desejavam meus olhos,não lhes neguei;nãoprivei meu coração de nenhum prazer, e ele desfrutou de todos os esforços. Julguei que esta era a parte que me cabia por todas as minhas fadigas.” (Ecl 2,4-10). Continuando depois, porém, o sábio conclui que “em tudo havia vaidade e aflição de espírito” (Ecl 2,11). Podemos mudar algumas palavras porque hoje as riquezas deste mundo têm outros nomes, mas elas continuam a ser o sonho e a esperança de muitos, cristãos e não. A ganância, a busca de bem-estar, a corrida ao sucesso, ao prazer e ao poder movimentam a vida de muitas pessoas, são as verdadeiras razões de vida para muitos. Parece que não existam outros bens a não ser os materiais, outra alegria a não ser a que vem do consumo e da diversão. Para isso, estamos dispostos a lutar, a travar as nossas guerras grandes e pequenas. Não importa se milhões de seres humanos morrem de fome,sobrevivem das sobras, perdem dignidade, direitos e liberdade. Estamos tão acostumados com a situação de uma humanidade feita de vencedores de um lado e perdedores do outro, que acabamos considerando tudo isso normal, justo e até merecido. Contanto que nós estejamos do lado certo. Dos vencedores, provavelmente.

Jesus, que nós ousamos chamar de nosso Senhor, passou a vida e morreu do lado errado. Nasceu e viveu pobre, sem nenhum poder humano ou posição social de relevo, foi preso, condenado e morto, fora da cidade, como um malfeitor, com a morte dos escravos rebeldes. A culpa dele foi ter contestado um poder religiosos que carregava de normas as costas das pessoas, considerava pecadores os pobres, não sabia mais buscar e perdoar as ovelhas perdidas, excluía todos os que tinham algum tipo de doenças, de lepra ou de loucura. Os poderes se juntaram contra Jesus: “Naquele dia, Herodes e Pilatos ficaram amigos um do outro, pois antes eram inimigos” (Lc 23,12).

Ao longo desta Semana Santa, que iniciamos, levantaremos muitas vezes os olhos para o Crucificado, pensaremos e refletiremos sobre as suas chagas e os seus sofrimentos. Com certeza colocaremos também aos pés da Cruz os nossos sofrimentos, as nossas traições, os nossos pecados. Pediremos perdão. No entanto precisamos lembrar que o Aleluia da Ressurreição, que cantaremos no Domingo de Páscoa, será da “vida nova” de um “vencedor” que escolheu o lado dos fracassados da vida…

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