O remédio para todos os males
Dom Pedro José Conti
Bispo de Macapá
Certo dia uma pessoa perguntou a um sábio médico: – Existe um remédio para curar todos os males? – Existe, sim – respondeu o sábio médico. Me escute: – Pegue o açúcar da penitência, a flor da caridade fraterna, a folha do amor aos pobres, o fruto da humildade e, com isso, encha bem o pilão da misericórdia. Depois esmigalhe tudo de joelho, filtre a mistura no lenço da aflição e tome-a junto com as lágrimas no meio da noite. Eis o remédio para todos os males. Ele cura não somente o nosso homem interior, limpa, purifica e renova também o homem exterior.
Com o 10º Domingo do Tempo Comum voltamos ao tempo litúrgico que nos acompanhará até o Advento. Continuamos a leitura do evangelho de Mateus e encontramos o chamado ao seguimento que Jesus faz a um cobrador de imposto de nome, também, “Mateus”. Nunca saberemos com certeza se este “Mateus” é mesmo o autor do primeiro dos quatro evangelhos. Quem o escreveu pode ter tomado emprestado o nome daquele apóstolo. No entanto, é uma página muito bonita e iluminadora sobre o jeito de Jesus de escolher os seus primeiros e mais próximos discípulos. Várias coisas chamam a nossa atenção. A primeira é que Mateus é um cobrar de impostos ou seja um colaborador comprometido com aqueles que exploravam os pequenos produtores e os trabalhadores em geral. Hoje diríamos que ele era um corrupto que lucrava amparado pelas autoridades locais e estrangeiras, neste caso, os romanos. A situação profissional de Mateus não impede, porém, o chamado dele. Igualmente impressiona a rapidez da sua resposta: “Ele se levantou e seguiu Jesus” (Mt 9,9). Nenhum vacilo, nenhum questionamento. Parece quase que Mateus estivesse aguardando só uma oportunidade para largar aquela vida desonesta que, talvez, já não o deixava mais feliz. Por fim, mais uma surpresa. O, agora, “ex” cobrador de impostos está tão contente com a pronta resposta que deu ao Mestre que organiza um banquete convidando Jesus e os seus discípulos, mas também muitos colegas de abusos e falcatruas. Como era de se esperar, a situação levanta as críticas dos fariseus que não conseguem entender esta aproximação, escandalosa para eles, entre Jesus e aquelas pessoas que, por não respeitar as normas da Lei, eram apontados publicamente como pecadores. Jesus não se deixa intimidar pelas críticas e responde à altura lembrando a todos as palavras do profeta Oséias: “Quero a misericórdia e não os sacrifícios” (Os 6,6). Afirmando pois que são os doentes que precisam do médico e não os sadios, ele está explicado também o porquê do seu convite especial dirigido aos pecadores.É neste sentido que o chamado de Mateus se torna exemplar. A possibilidade de mudar de vida deve ser oferecida a todos e a todas. Acontece, muitas vezes, que as próprias pessoas se acham tão erradas que consideram impossível o perdão de Deus. Esta maneira de pensar porém pode ser culpa dos que se auto definem “bons” cristãos – os justos de hoje – que, em lugar de ensinar a misericórdia e o perdão apresentam somente ameaças e castigos, como se falar do demónio e das penas do inferno fosse mais importante que anunciar a alegria e a paz oferecidas a quem deseja mudar de vida apesar das suas fraquezas. Talvez seja este o grande pecado que os “bons” esquecem de confessar, aquele do orgulho e, mais ainda, de julgar e condenar a vida dos outros. Quando Jesus perdoava aos pecadores, nunca lhes dizia de continuar do mesmo jeito, ao contrário os exortava a não pecar mais e lhes oferecia, antes de tudo, misericórdia e bondade. Poucos ou ninguém se corrige por medo. Todos nós mudamos os rumos das nossas vidas quando reconhecemos que o novo caminho que se abre à nossa frente, também se apertado e fadigoso (Mt 7,14) é aquele certo que nos enche de esperança e abre horizontes nunca antes imaginados. Foi isso que Mateus, o pecador do evangelho deste domingo, percebeu quando Jesus o chamou: algo muito mais valioso que o dinheiro o estava aguardando, o Reino de Deus. O olhar do Senhor e a sua misericórdia o curaram. Este é o remédio para todos os males.